domingo, 1 de março de 2015

O ESCURO, O OBSCURO, O TUDO E O NADA

O escuro, o obscuro, o tudo e o nada, fazem parte da mesmo tudo ou do mesmo nada, apesar de representarem coisas diferentes, o tudo nasce do nada e o nada nasce do tudo, assim como a luz nasce da obscuridade e obscuridade nasce da luz. (Uma imagem poética e quotidiana desta reflexão, é o nascer do sol, que desponta da escuridão da noite e o seu retorno a ela, engolido pela sua escuridão). Para nós terrestres, o vemos assim, mas sabemos que o sol ou os sois e estrelas estão dentro do escuro do universo e. o universo está cheio de sois e estrelas, isto é, de luzes brilhando e nascendo nesta escuridão.

Dentro deste escuro e obscuro, deste tudo e deste nada, está o desejo, que trama furtivamente e disfarçadamente, viajando entre pensamentos e observações cheias ou vazias, fruto dos impulsos nascidos dentro do universo psíquico da inteligência. 

De onde nasce este impulso, este desejo, esta força que chega do nada e se faz tudo? Uma pergunta com infinitas respostas, endereçadas nas abordagens filosóficas, psicológicas e neuro científicas. Cada uma com sua explicação, ou melhor, tentativa de delimitar o desejo em armaduras cognitivas, que expliquem e reproduzam o fenômeno do desejo. Mostrando a seu nascimento, evolução e morte.

Mas quais são os elementos da gênese do desejo? Para o desejo, não importa qual a sua fonte, qual a sua origem, pois ele quer é ser satisfeito e quanto mais reprimido mais se fortalece e irrompe de qualquer modo ou maneira, e se faz presente. É como os vilões dos desenhos animados de ficção, tipo aqueles feitos de energia, que quanto mais se joga bomba e fusão de átomos, mais ele se recarrega. Quanto mais negamos mais ele se fortalece. No caso do desenho animado, o que mata o vilão energético, de maneira fantasiosa, é uma carga igual e contrária, que somadas neutraliza a sua força, transformando a força ou o todo em nada.

No caso do desejo, esta força igual e contrária que desacelera e anula o desejo se chama "consciência" e é gerada na não retenção do desejo, mas sim na sua transformação do seu caracter obscuro e desconhecido, em caracter claro e conhecido, através da linguagem. É neste processo que se dá a catarse dialética da psicanálise e da psicologia analítica.

A partir do momento que o Ser ser reconhece na própria obscuridade; onde este tudo movido pelo desejo, se transforma em nada, transformado pela consciência, é que se inicia o processo de esvaziamento do desejo e o poder que ele exerce sobre o indivíduo passa a ser cada vez menor, até a sua completa absorção pelo aparelho psíquico, como agente desprovido de força. Este não deixa de existir, mas existe como elemento em si, como potencial, como imagem, mas sem força para operar. Mesmo assim, está ali, esperando uma oportunidade para se manifestar, caso o processo consciente sofra novamente alguma nebulização da consciência. Neste caso se reativa e passa a se fortalecer novamente. 

Dos traçados neurofisiológicos gravados no sistema psíquico, nada se pode cancelar ou eliminar, mas se pode reescrever em outras "páginas" e deixar as "páginas" passadas sem força, passando a adotar novas estruturas mais convenientes, produtoras de desejos mais recompensadores, que justifiquem novos procedimentos que portem "felicidade". Neste processo o papel da consciência é fundamental para poder dar luz a todo o processo interno, trazendo "luz", a obscuridade dos desejos primitivos, dando origem a desejos secundários.

Fazendo uma comparação com o HD de um computador, sempre que gravamos algo na memória do computador fica registrado e, mesmo que seja re-escrito no mesmo espaço físico, ficam ainda resquícios dos dados, aparentemente apagados, por duas ou tres mais re-escritura, no mesmo espaço, o que possibilita a certos programas recuperarem estes dados. Mas isto somente se a re-escrição dos dados for ainda a primeira ou a segunda, pois depois de algumas re-escrições, não se consegue mais a recuperar os dados primários. Mais ou menos acontece com as nossas experiências, com a diferença que, não importa o numero de re-escrições feitas pela nova consciência das obscuridades, os dados primários ficam sempre, "virtualmente" presentes no aparelho psíquico do indivíduo.